Ela nasceu no interior da Paraíba e tinha uns olhos gigantes, de um verde contrastante com a terra seca do sertão. Corpo de recém-nascido e já maltratado pela seca e pela fome, pesava cerca de três quilos aos sete meses de vida. Desenganada pela sorte, desnutrida, castigada pela natureza e pela desnatureza social que aparta os excluídos, foi assim que um dia chegou às nossas vidas. Não tinha roupa, não tinha certidão de nascimento, não tinha um nome sequer... Chegou num ônibus da Itapemirim com outros retirantes, retirados, desnutridos, refugiados de uma guerra sem fim contra a miséria e o abandono. Chegou à nossa casa usando um saco plástico como fralda. Deixada para morrer pelo desengano da vida, chegou abandonada como tantas outras crianças, filhas e filhos do mesmo destino de nascimento e que por teimosia de uma força inexplicável, sobrevivem aos sacos jogados ao lixo, aos córregos e rios; crianças, bebês por vezes deixados, lançados pelas mãos daqueles dos quais se esperariam
Literatura das Margens _ Literatura e Educação